Imensidões

Há imensidões de nós que na calada da noite são transcendências avulso...

Thursday, January 05, 2006

Sem Título III

Emancipas-te em actos de deleites, em puras conversas, em cigarros incadescentes, mas lá no fundo nem sabes bem o que sentes.
Esboças sorrisos, alegrias, manifestas opiniões e sarcasmos, mas de ironia pouco vive a tua tranquilidade.
Incongruências dum acto singelo, instantes dum manifesto árduo.
Entregas-te à música como as gaivotas ao mar, vagueias nos percursos criados como os olhares perdidos numa rua atribulada.
E...
E tanto, e nada, e tudo ao mesmo tempo, e coisa nenhuma na real percepção do sentir. Inconstâncias.
Incompreensões, alienações. Dizes que queres fugir mas sentes os pés demasiados nesses momentos em que a mente vagueia por supostas fugas.
As drogas de que servirão agora? De presenças imponentes ou de estados deambulatórios, falsos e impuros? De melhorias? Ou de desgraças?
O amor sempre teve o altar dele, sempre, mas nem nesta altura a sua chamada por mim, pelos deleites de toques e corpos, torna-se inaudível.
Se eu ao menos pudesse acreditar no que vejo, no que lá fora as cores e pessoas despertam, aí, aí talvez... um talvez duma qualquer coisa que desconheço, mas que fortaleço pela importância do pensar nas possibilidades.
Porque pensar demasiado dói, porque não pensar "animaliza-me".
Porque querer torna-me ambicioso, porque não querer tanto torna-me sonhador e Ícaro, e da história dele toda a gente sabe.
Porque acreditar em algo faz-me crer na utopia, porque o não acreditar devolve-me o nada.
E o nada é demasiado pesado, um fardo demasiado hercúleo.
Porque quero tanto falar eu de mim? Porquê? Porque é que sempre o que escrevo é em torno de mim, e não das magníficas Tileiras por onde passo, e não das subtilezas extasiantes do mundo natural, ou dum sorriso duma criança, sobre alegrias e actos concretizados, de sonhos que não passam disso na cabeça de quem os vive, e que assim se sentem bem, porque na materialização o encanto perde-se. Porquê?
Porque eu na realidade penso demais nas coisas, porque não me conformo, porque sou um rebelde, porque sou um inconstante, mas um amante nato da vida, porque me irrito tal como todos, porque choro tal como todos, porque sou humano, e falho e tenho sucessos, só que o maior deles todos, ainda não alcancei, talvez seja mesmo ambicioso, talvez queira tudo duma vez, mas já tenho tanto, não me chegará?
Porque digo eu que não quero ninguém na minha vida, blá, blá, blá... quando na realidade quero tanto, quero mesmo que se lixe o passado, as relações que já vivi que agora somente vivem nos murmúrios de ventos antigos, quero mesmo amar, e nego-o.
Quero mesmo alcançar o maior de todos os bens, a tranquilidade e evito o caminho mais fácil. Complico, crio Equidnas e Quimeras e no seio duma fogueira crio conversas com os meu próprios monstros... e porque não acreditar neles? Penso eu.
Tudo é tão baço, estranho, irónico.
O afogar de tanto, o submergir de nada, no topo flutua cansaço, no fundo descansa a imaginação...
O cansaço funde-se comigo e empreendemos uma viagem pelo meio de sebes mais altas que qualquer esforço...
É sempre aí que paro e penso, é sempre ai, quando o cansaço consome, que paro e escrevo, tal como hoje, porque na realidade eu sei que seria tudo mais fácil se também eu facilitasse as coisas.
As drogas... serão elas a solução, os anti-depressivos e ansióliticos? Serão? Não serão talvez placebos? Ou uma cura distante? Uma realidade disforme, uma personalidade destronada?
Vou tentar, não confio muito, tentarei. O certo é que me sinto mais calmo, deixo a vida correr lá fora, deixo os amores vaguearem pela rua, e se por acaso uma brisa me despertar o íntimo, aí... aí talvez pare, descanse um bocado, expulse o cansaço que se abate sobre mim, e arriscarei, de qualquer modo o que é que custa, não é?
Tudo é simples por vezes, tudo é fugidio também, tudo é efémero, mas as sensações, essas, por mais momentâneas que sejam, cravam na pele, em tons de colossais memórias, as vivências...
E elas só me dizem que por mais que fuja, por mais que queira saber estar num qualquer lugar, esse saber estar invoca demasiadas transcendências. E só se sabe estar num único lugar.

10 Comments:

  • At 8:00 PM, Anonymous Anonymous said…

    Fico estupidificada quando lei as tuas palavras. Sinto-me impotente para comentar, se é que é possível comentar algo que é tão pessoal como aquilo que escreves. E tão belo.
    Beijo doce :-)

     
  • At 8:00 PM, Anonymous Anonymous said…

    *leio

     
  • At 10:26 PM, Blogger Vênus said…

    Olá Pedro!
    Adorei tua nova casa...
    Feliz 2006!
    Um beijão!

     
  • At 11:03 PM, Anonymous Anonymous said…

    é isso.o que queremos é tão simples que acabams por fugir.e falamos de nós em vez de contarmos cm respiramos o mundo...
    tocaram-me realmente as tuas palavras...*

     
  • At 11:38 PM, Blogger Titá said…

    Concordo com o 1º comentário. É sempre tão dificil fazer um comentário perante tamanha sensibilidade e beleza de escrita. Por outro lado, é impensável, passar por aqui, ler-te e naõ te deixar um bem haja pelos momentos úncios que nos proporcionas.
    Este foi mais um momento que guardo no cantinho da beleza.
    Desculpa o sem jeito deste coment e aceita mais uma vez o meu obrigada.
    bjs

     
  • At 2:29 PM, Anonymous Anonymous said…

    Ler-te é sempre um enorme prazer :)

     
  • At 8:36 PM, Blogger Eli said…

    Olá Pedro!

    Eu já escrevi sobre a tua escrita montes de vezes...

    Hoje gostava de te dizer que tens aqui alguém, um apoio, um colo, se precisares, ou mesmo que não precises...

    Vi um pouco nas tuas palavras a felicidade e o orgulho do ser independente, mas também a falta... ausência... de alguém com quem partilhar todas essas sensações...
    ...onde é que eu já vi isto!

    Conta comigo.

    :)

     
  • At 12:13 AM, Blogger Eli said…

    Hmmmm

    Um sorriso te espera. Nunca acreditei muito em promessas, pois como já disse, basta-me apenas acreditar. Se me dizes algo, eu acredito.
    Claro que tudo isto tem um contexto, e... sabes, desta vez EU VOU COBRAR!

    Tu não és alguém que eu visite por acaso. Não és apenas um rosto num blog a preto e branco. Eu não venho aqui por acaso, mas porque sempre revelaste uma partilha, um lado que só quem considero amigo tem!...

    Sei que não tens tempo, mas, quando puderes e, mesmo que não possas, eu estarei aqui. Os amigos nunca são demais, e tu não és apenas mais um!

    Apetecia-me deixar aqui o meu mail... mas deixo-te à vontade para mo pedires quando o quiseres!

    :)

     
  • At 7:41 AM, Blogger DT said…

    A incerteza do pensar e a certeza do sentir... A teia que teces em pensamento é demasiado complexa para te conformares com um facilitar das coisas. Por isso escreves dessa maneira, que nos faz sempre voltar à tua imensidão.

    Está fantástico!

    Deverá ser a 2ª vez que recebes este comentário, pois deixei-te (por engano) estas mesmas palavras com um outro username, que nada tem a ver com as ideias que aqui se trocam. Como tal, tomei a liberdade de apagar o comentário anterior.

    Grande abraço

     
  • At 10:35 AM, Blogger Patyçazinha said…

    Olá Pedro,
    Muito belo o teu texto, a impressão que tenho, é que ele foi escrito do fundo da Alma!
    Um feliz 2006 pra ti...
    Bjs

     

Post a Comment

<< Home